Ao buscar o filho na quarta-feira (22), a mãe viu a criança de 6 anos com uma fralda adulta amarrada por profissionais, que segundo a genitora, ‘não têm paciência’ de levá-lo ao banheiro. Prefeitura vai abrir sindicância. Dia 21 de março foi foi comemorado o Dia Mundial da Síndrome de Down. Mãe denuncia humilhação sofrida por filho em escola
Arquivo pessoal
A mãe de uma criança negra com síndrome de Down denunciou em suas redes sociais a humilhação sofrida pelo filho em uma escola municipal de Carapicuíba, na Grande São Paulo, na última quarta-feira (22). Ela conta que ao buscar a criança na escola se deparou com ela vestindo uma fralda de adulto descartável amarrada aos pedaços.
“Lembrando que já é uma criança desfraldada, mas para ele conseguir ir ao banheiro precisa de auxílio de alguém. Às vezes, eles [profissionais da escola] levavam, mas não tinham paciência de esperar, e ele voltava muitas vezes do banheiro sem conseguir fazer as necessidades”, contou a mãe.
A criança de 6 anos, estuda na Escola Municipal de Ensino Fundamental Professor Argeu Silveira Bueno. Segundo a mãe, ela questionou a instituição e funcionários sobre o ocorrido, mas foi ignorada. Prefeitura afirmou que vai abrir sindicância para apurar os fatos (leia mais abaixo).
“Eu vi a humilhação gigantesca sobre o meu filho e isso me abalou muito”, disse. Indignada, ela fez um vídeo mostrando o estado do menino ao chegar em casa. A criança está chorosa e tentando entender.
Ao g1, a responsável, que prefere não ser identificada por medo de retaliações, contou ainda que sempre teve dificuldades de conseguir garantir que seu filho tivesse acesso à educação e que a escola não oferece profissionais para atender e cuidar do menino.
“Muitas vezes, eu tenho que voltar com ele para casa porque eles dizem que não tem ninguém para ficar com ele, só se eu mesma quiser ficar, mas como? Eu preciso fazer ‘bico’ para manter as coisas na minha casa. Infelizmente, as pessoas fazem muito descaso, não veem que já estamos esgotadas, que a inclusão está sendo negligenciada e as nossas crianças deixando de aprender e ter o suporte que deveriam ter”, relatou a mãe do menino.
Procurada para falar sobre o caso, a Prefeitura de Carapicuíba, por meio da Secretaria da Educação, informou que vai tomar as providências administrativas cabíveis.
“A Secretaria de Educação repudia qualquer tipo de discriminação e postura inadequada dos profissionais perante aos alunos e vai abrir uma sindicância para ouvir a mãe do aluno e tomar as providências administrativas cabíveis”.
Em nota, a gestão municipal ainda disse que a escola possui Adebs (Auxiliares de Desenvolvimento de Educação Básica), que realizam o acolhimento das crianças com deficiência. “De acordo com a direção da escola, para que a acolhida seja individualizada, primeiramente os demais alunos são levados para as salas de aula e em seguida os estudantes com deficiência. A escola atendo o aluno de forma contínua e por opção da mãe, ele sai mais cedo da aula”, completou em nota.
Invisibilidade de pessoas negras com Síndrome de Down
No último dia 21, um dia antes do ocorrido com menino em Carapicuíba, foi comemorado o Dia Mundial da Síndrome de Down, para celebrar a vida das pessoas com a síndrome e garantir que elas tenham as mesmas liberdades e oportunidades que todas as pessoas. A data faz referência ao cromossomo “21”, justamente aquele que possui a alteração genética que caracteriza a síndrome, enquanto março, o mês “3”, indica a trissomia.
Prestando apoio jurídico à família do caso citado pela reportagem, o Instituto InvisibiliDOWN atua na luta de famílias nesse quadro. Por meio dessa causa, a instituição busca dar visibilidade no que os fundadores apontam ser um assunto pouco comentado, mas que une dois temas: o racismo estrutural e a síndrome de Down.
Thiago Ribeiro explica a proposta do instituto que começou com um projeto de fotografia dele, baseado em um estudo norte-americano de 1982 a 1996, que aponta que a expectativa de vida de pessoas negras com síndrome de Down chegava a ser 50% menor quando comparadas com pessoas brancas. A pesquisa foi publicada pela Pediatrics Nationalwide.
Para Thiago, casos como da família de Carapicuíba não são isolados.
“A gente vem trazendo a atenção que as pessoas negras não estão chegando na fase adulta, por causa de negligência, por conta de médicos que dizem para as mães que pretos não têm Síndrome de Down. Então, são mitos que a gente vem desmitificando, ao logo do tempo, e a gente se depara todos os dias com casos como o dessa mãe e desse menino de Carapicuíba”, disse o fundador.
O trabalho voluntário do Thiago, morador da capital paulista, e da Alyne Gonçalvez, munícipe de Carapicuíba, começou em agosto de 2022. Os dois, pessoas pretas com filhos portadores de síndrome de Down, se uniram para evidenciar a realidade e garantir direitos às outras famílias pretas e pobres, em relação ao acesso à saúde e aos serviços de terapias. Segundo o fundador, o instituto tem um grupo de acolhimento com cerca de 100 famílias nesse contexto.
“O que a gente propõe como trabalho e como luta não é só para o meu filho, mas também para que outras pessoas como ele, possa ter o mínimo, diferente do que a gente vê as organizações e a internet mostrando: um universo maravilhoso com salas super coloridas, cheias de pessoas se desenvolvendo, pessoas brancas, como sempre…”, contou Thiago.
Thiago Ribeiro e Alyne Gonçalvez, pais de crianças pretas com síndrome de Down, criaram projeto para dar visibilidade ao tema.
Arquivo pessoal